Mostrando postagens com marcador escritos. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador escritos. Mostrar todas as postagens

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

A mosca da nota e outras cousas

     Fiquei pensando, antes de vir por cá, se deveria postar ou não. Postá-lo-ei, decididamente. Mas antes...

     Perdoem-me. Vi que há novos visitantes por cá. Pode haver uma confusão na mente de vós ao abrir este blogue. Ele é íntimo e muito sentimental e piegas. A minha vida é um sistema solar que nem um humano sequer visitará, um sistema solar tão distante que nossas percepções caem por terra. Minha vida é madeira e pó sobre a mesa. Minha vida é cotidiana, é uma maçã. É isso, tenho a vida de uma maçã bem vermelha. Uma maçã que nunca será posta nas bocas dos que pensam como grandes homens. E se puserem, só visualizarão a sombra de minha vida, como só conseguiram visualizar a sombra dum átomo (http://www.inovacaotecnologica.com.br/noticias/noticia.php?artigo=foto-sombra-atomo&id=010165120704).
     Não precisam continuar lendo. Eu, de fato, uma dia tornarei esse blogue privado, como o diario que escrevo desde os sete nos de idade. Não sofrerei se ficar só. Entretanto, já que até é comum as estrelas agruparem-se pela gravidade, uma boa companhia seria como o café que eu não gosto tanto (prefiro chá). Uma boa companhia seria uma boa companhia (acho que estou no meu ponto alto de sentimentalismo no blogue).

     Bom, vamos ao referido em "postá-lo-ei" no início do poste. Meu dia fora ótimo. Dessa vez eu fui para a casa de praia da família. Eu tive a oportunidade, lá, de relaxar e tornar a pôr minhas energias.
     Antes que eu comece a escrever novamente notas de diário por cá, transcreverei a minha última nota no meu diário pessoal, nunca antes publicado aqui. Publicá-lo-ei por achar ter acertado na mosca. Até enviarei por carta para a pessoa sobre quem falo nele.  Façam conferir:

"Cabo, a 12 de novembro de 2012

     Música e literatura. Música e literatura. Música e literatura. Música e literatura. Música e literatura. Música e Literatura. Música e Literatura. Música e Literatura. Música e Literatura. Música e Literatura.

     Acordei às 14h no dia 11. Estou tão distante do V. — o nome foi abreviado apenas cá —, ao menos é como me sinto — sinto-me nostálgico, em súmula —.

     Quem era eu? Eu era um futuro teólogo. Que hei-de ser no futuro do futuro, pois? Por isso, não prometerei que nunca mais amarei ninguém.

     Eu tenho certeza. Eu a tive quando estávamos num autocarro. Antes era-me incognoscível o que eu sentia. O meu enternecimento na presença dele estava além de mim, mas ele — meu amor — agora é "Ele", e respira como uma máquina biológica. Eu tenho ciência, não sou apenas dominado. Ele, dessa vez o V., estava a olhar, absorvido em pensamento, para fora da janela. Fôra um daqueles dias que nos deixam exauridos e ansiosos por silêncio revigorante. Tudo o que desejei naquele momento foi tocar a sua mão, apertá-la e, com isso, como se houvesse uma ligação  intensa entre nós dois passar, a minha energia, que o acalmaria e fá-lo-ia sentir-se bem; também senti desejo de acariciá-la. Dele, eu poderia ter apenas aquilo, um único toque, uma única delicadeza, um único ato leve, mas eu seria o homem, de modo impecável, mais feliz do mundo, e para sempre.

     E se eu, em sonho, apenas ou ao menos, pudesse tocar seus lábios. Ah! então eu estaria pronto para morrer. Nem minha música seria importante. A única música que dura para sempre, que transpassa as imponências temporais, é a que os nossos ouvidos nunca hão de perceber, é o silêncio. Mas o meu amor, esse eu levarei, para sempre, em meus átomos, o levarei ao ataúde."

     É, na mosca eu acertei. Só não sei o que fazer com ela. Acho que não prenderei a mosca — fui profundo: o amor elucidado é um mosca? —, mas a porei em meu quarto. Não me importo se ele quiser sair pelo mundo  e mostrar suas asas transparentes para ele.

     Por último, vou organizar mais algumas coisas aqui no blogue. Criarei uma tag para a "música da semana", para o "livro do mês" e para "sobre cousas quaisquer". Os dois primeiros assuntos são deduzíveis, mas penso ser necessário explicar-lhes do último: eu falarei acerca d'algo aleatório. Por exemplo, eu escolhi falar sobre chaves agora mesmo. Então, eu vos falarei acerca de chaves agora mesmo.

    Não corrigi nada. Estou sonolento. Quero adormecer com meu violino ao lado lendo algo impessoal.

    Boa noite estrelada para vós (estou tão pouco melancólico para quem assistiu Trier hoje)! :] 

domingo, 14 de outubro de 2012

     Que vizinhos deveras festeiros! Quanto ruído! Gostaria de estar a estudar música, mas então tive uma ideia: tentar entender minha caligrafia de manuscritos antigos e passá-los para a máquina.

     Eu devo ter falado algum dia que estou a compilar meus escritos e a produzir mais deles para que no próximo ano consiga publicá-los. Eu sonho!
     Esse sonho começou quando minha professora de língua portuguesa disse que eu poderia ser o membro mais novo da Academia Cabense de Letras.

     De fato, divirto-me com títulos como "A História de Vêz" ou "Prólogo Soliloquial dum Educando Individual de Filosofia".

     Agora, encontrei algo. O nome do escrito é "Círculo: Título Realmente sem Título". Ele é uma daquelas coisas que se encontra em estupefação e descrença pelo que se vê. Indago-me: realmente escrevi isto? Céus! Eu tinha 14 anos quando o escrevi e estava no intervalo da escola. Falo um pouco da minha sexualidade no final, eu estava em conflito comigo mesmo. Foram bons tempos de grandes descobertas. Leiam-no:

Estou e não estou. Sub-existo, assim como meu espaço, que meu nada é. Tudo e nada importa numa lógica ilógica que, sobretudo, sempre é lógica. Mas a nossa lógica ocular não é capaz de entender. O quê? Sei lá! Minha escrita é inconsciente. Sei que sub-existo neste círculo, vácuo, espaço tão cheio, mas tão inóspito e..., digamos..., qual a palavra mesmo? Ah, "circuloso". Mas voltando ao assunto, vocês, celuloses, provavelmente observaram a minha distração de espírito. O que é espírito? Falo espírito de espírito mesmo e não espírito. Pare Inquisitividade! Desejo voltar ao assunto e ponto, mas não este ponto, esse.
      Agora é o verbo ser, pois a minha distração de espírito cansou-me — insisto —, Pare! O que eles pensarão? Bom, mas voltando ao assunto celulose. O que eu sou? Para resumir? Tudo bem. Estou no intervalo e quero aproveitar este breve espaço de tempo para ler. Mas quem quer saber, não é mesmo? Ah, quem me dera se ela soubesse: loucura consumível alheia. Ah, se elas soubessem, ou melhor, se eles soubessem que eu sou essa Sinfonia de Marcianos do Absoluto de Nada.

     

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Conversa comigo mesmo

— "Professor, me desculpe. É que eu estou numa fase de transição. Está tudo muito difícil e minha vida está uma correria, como sempre. O Sandro saberia bem do que eu falo. Tudo vai normalizar. Em breve..."

...

— "Meu Deus! Mãe!, nunca imaginei que era tão bom ficar assim, só. Preparar o próprio almoço é ótimo. A noite ficou mais bela, ela se tornou minha. Não me senti tão só. Vai para a casa da praia próxima semana também? A senhora precisa relaxar."

     Vou por leite no copo; penso nele. Enquanto isso, começo a imaginar uma situação na fila do Teatro.
     Como sempre, ele chegava por trás e me dá um susto com suas mãos tocando subitamente a minha espalda. Entre as conversas, nos embaraçamos ao percebermos que estamos a entrar em caminhos que revelam os segredos secretos sobre nós, escondidos com sutileza dentro de ambos. O olhar manso dele. O olhar absorto meu; rimos, então.
     Ao sentir o leite na minha mão, volto para esse mundo onde escrevo isso agora. Tenho uma ideia, repentinamente. Uma grande descoberta estava por vir. Eu, inocente que sou, nem imaginava. O destino é cruel, e, apesar de sentir fortes dores de cabeça com o aroma de algumas rosas, eu sempre imaginei que o céu era feito de pétalas brancas.
     Vejo uma gota de leite cair sobre a mesa da cozinha e a tomo com o dedo para pô-la em degustação na boca. Eis a descoberta:

— "Leite sem açúcar não é gostoso. Não gosto de leite sem açúcar."

domingo, 2 de setembro de 2012

     "Não a executes, é o que deves fazer.Não a escutes e a possuirás. Não ames e terás dentro de ti o amor. Não fumes o teu cigarro e terás um cigarro aceso dentro de ti. Não ouças a Quinta Sinfonia de Beethoven e ela nunca terminará para ti."

Trecho da carta de Clarice Lispector para Hermengardo escrita em 30 de agosto de 1941.

domingo, 19 de agosto de 2012

A Paixão Segundo G.H., "A Pedra Verde na Música de Luiz Gonzaga e o Mundo" e Peer Gynt

     À apreciação da música incidental Peer Gynt do compositor norueguês Edvard Grieg com a Estonian National Symphony Orchestra, cuja citada obra é uma musicalização duma peça teatral de cinco atos do dramaturgo moderno norueguês Henrik Ibsen. Só a aprecio e escrevo, vou deixar análises para depois. Digo, antes de dizeres que não conheceis a obra, que vós a conheceis mui bem. E eu hei de provar no final do poste.
     
     Eu não deveria estar cá, pois estava a terminar de ler A Paixão Segundo G.H. de Clarice Lispector. Mas eu desejei escrever   um pouco, então...
     Esse é um livro que deixou-me com um espanto infantil estrondoso de mudez e uma certa consternação, e talvez até senti-me exasperado no primeiro contato chocante com a nova realidade que a escritora abordava. Antes de lê-lo achava-me humano, primitivamente humano. Mundano, celeste e necessário. Mas Clarice, mais uma vez, transgrediu-me e fez-me transcender. Perdi-me pela encanação do prédio; desorganizei-me e morri. E por morrer é que estou vivo escrevendo para vós. Bom, outro dia eu o resenho para vós, já que eu sequer terminei de lê-lo.
     Por fim, assim como minha amiga, a Geovana Germano, que disse que eu deveria lê-lo o quanto antes possível, me convencendo com a sua narração do limiar irreal e ilógico da estória de Lispector, digo para vós que esta é uma leitura altamente recomendável. Aliás, ela é uma leitura altamente recomendável principalmente para aqueles que já possuem alma formada.

    É entre a Literatura e a Música onde eu vivo. Uma começa quando a outra termina, respectivamente. De modo natural, um bom compositor, assim acredito, deve dominar ambas. Eu trabalho e estudo para dominá-las, é um de meus objetivos finais enquanto organismo vivo neste planeta.
     Como já falara aqui, a 23 de agosto farei uma apresentação na câmara municipal. É a segunda vez que sou convidado, ou seja, um honra para mim. Como parte da preparação do repertório, eu estava a fazer um arranjo para piano e violino d'algumas músicas do conterrâneo Luiz Gonzaga, já que irei honrar a arte armorial por lá no centenário desse artista "perrnambucano". Eu irei falar algo, claro, antes de minha apresentação.

"Que tal fazer um discurso antes de apresentar os músicos que hão de me acompanhar?" — pensei.

     Após ter pensado no discurso, tive a magna ideia de transcrever uma redação da verificação bimestral de aprendizagem que fugiu das regras estruturais — meu professor diz que sou rebelde e anarquista escrevendo e compondo, então o céu para mim está na prática da obediência ao escrever e compor — que fugiu das regras estruturais para um discurso. Isso é algo como " eu sou bom em poesia, mas preciso melhorar no poema", segundo disseram-me.

     Agora, ao retirar o rascunho da redação, que foi o primeiro, de meu fichário tento analisar qual o título que dei eu para ela. Olho atentamente para a margem superior da lauda procurando o título, mas encontro apenas a anotação do número de linhas disponibilizados na verificação de aprendizagem: "27 linhas".
     Revirando o baú mental, posso quase ter certeza que o título era " A Pedra Verde na Música de Luiz Gonzaga e o Mundo", então fiquem com "A Pedra Verde na Música de Luiz Gonzaga e o Mundo — por divino obséquio, comente se pensares nalgum novo título — :

     " Luiz Gonzaga representa, ao mesmo tempo que é festivo e noturno em sua obras, o âmago e a cerne da alma nordestina não só para o Brasil, mas outrossim ao mundo.
     Nós sabemos o quão exímio foi ele em sua arte, e isso fê-lo mostrar além das vivacidades festivas das terras de cá. Ele foi um artista cujo apogeu musical vivenciou o estabelecimento da soleira do templo do Movimento Armorial de Ariano Suassuna, onde as artes eruditas e populares bailavam juntas e onde o divino e transcendental  faziam bailar com o humano e o visceral. Isso, sem dúvida, o influenciou e o fez  mostrar o quão verdes são as nossas pedras, que nas bandas de cá existem em  excesso.
     A prova da influência do eruditismo, algo que o eleva para outro patamar,  em suas obras está na mudança de tons, de Sol Menor para Lá Maior, como exemplo, que brotam inúmeras vezes nas músicas compostas por ele e Humberto Teixeira  a partir da década de 50, quando era germinado o Movimento Armorial. Apenas ótimos compositores fazem essa proeza de mudança de tom numa música em prol da harmonia. A crítica social em ABC do Sertão é outra prova da influência do modernismo erudito, que vê a arte com propósitos sócio-estéticos.
     Ele faz tornar mundial sua música em Pagode Russo em Sol Menor, onde o motivo do tema principal é inspirado, mesmo que inconscientemente, em populares músicas das noites  russas czaristas  em bordéis, que também inspirou o grande compositor russo Tchaikovsky, a obra do último citado, por sua vez, muito relacionou-se com as pinturas abstratas de Kandinsky.
     O erudito Rafael Garcia diz que ele é um dos maiores compositores entre os eruditos e populares da música nacional. Eu digo que ele quebrou nossas pedras verdes e espalhou pelo mundo, ele fez a Terra da Pedra Verde ganhar o mundo.  Amém!"

     É, ao escrevê-la novamente vejo que preciso fazer algumas modificações e também noto que viajei alguns séculos escrevendo-a. 
     Deu para notar o repertório? Ainda terá Chanson Triste de Tchaikovsky (a interpretação do link com o Bratza é minha favorita).

     Pararei por cá mesmo. Amanhã escreverei acerca do X Encontro de Música Antiga de Recife/Olinda e do BookTour da Evana Ribeiro.

     Acho que não é só hora da prova, é hora da evidência. Com vocês, Morning Mood da obra incidental para orquestra sinfônica composta por Edvard Grieg:

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

O visual, Aventuras Quânticas no Transporte Público Brasileiro, Per Aspera ad Astra

     Fizeram notar o novo visual? Sim, claro. É devido a um livro que li antes de começar a escrever neste blogue. Ainda não fiz resenha dele pois foi Clarice Lispector quem o escreveu. E eu a como, sinto-a e a digestão demora dias, mas por vontade própria, pois só se ler ela assim. Quem leu o livro descobrirá por uma lembrança da capa que será trazida pelo novo plano de fundo do blogue, sem citar o novo título, que fala absolutamente tudo, descartando até o plano de fundo inexato. Também pretendo trocar o endereço do blogue em cinco dias para "adescoberdomundo.blogspot.com".
     Eu pensei em escrever este poste e falar acerca do Alexandro, do qual eu já tratei aqui. Ocorram-me muitas coisas incríveis e também assaz deprimentes na última semana, de 29 a 5 de agosto. Eu o vi pela primeira vez, como descrevi no link citado, a 17 de abril de 2012, após o crepúsculo numa noite chuvosa. Pensei, após enviar meu correio eletrônico para minha amiga e ler sua resposta, que o eu esqueceria. Mas após o crepúsculo de 31 de Julho de 2012, numa noite chuvosa, eu o vejo entrar no ônibus e sentar no lado direito do autocarro, onde eu também estava e onde era o lado oposto donde nos sentamos juntos pela primeira vez. Fitamo-nos, lembramos de nós dois, era a prova que sentimos algo naquele dia.
     Entretanto, eu não quero continuar, pois não estava em minhas pretensões ir tão profundamente no meu escrito acerca do "ocorrido de carência". Descrevi objetivamente — há bem mais subjetividade e psicologia do que possam imaginar —, houve muitas emoções, idiossincrasias e outros gestos peculiares que observei. Eu tremi, fiquei extasiado e parei de ler um artigo acerca de mangas. Nos excitamos, ele me sentiu a algumas cadeiras além de mim e eu o senti. Fechamos as janelas ao mesmo tempo e também olhamos concomitantemente para a criança que chorava. Houve muitas outros pequenos ocorridos nesse magno acontecimento. Mas eu desisti e pretendo fazer de Alexandro nada mais que um personagem em minhas estórias. Ele há de ser meu eu lírico no mundo real, eu o sentirei enquanto escrever, e ele será meu eu lírico no mundo em que criarei. Então, ele me abandonará nas "Aventuras Quânticas no Transporte Público Brasileiro" e continuará existir noutros contos meus. Talvez ele me pertença na vida real, se não, estou conformado desde já. Resigno-o com paciência mansa de árvore secular. Paro aqui, pois como já disse meu escritor francês favorito, Guy de Maupassant, "a memória é um mundo mais perfeito que o Universo".

     Hoje conversei com o maestro L. T.,  incrível como em algumas horas conversas nos tornamos íntimos, amigos e fraternais. O propósito de nossa conversação era apenas tratar de assuntos acadêmicos acerca de meus futuros estudos noutras instituições. Foi tudo marcado e houve toda aquela solenidade de início de conversa entre pessoas que não se conhecem. Ele namora o T. S., que me indicou para ele, o L. T. É um casal lindo! Se tiverem lendo-me saibam mais uma vez que os congratulo e desejo muita iluminação, paz, amor e sucesso ao relacionamento.
     Mas a cerne da conversa e o que cá anseio expor não está em nada do que falei, está nas lembranças que trouxe-me ela. Uma delas, fez-me retornar para quando eu tinha quase 14 anos, quando também escrevi um conto que até hoje leio em vertigem. Eu o escrevi numa biblioteca e publiquei ano passado no sítio virtual (Autores.com.br). Ele chama-se Per Aspera ad Astra, leiam-no:

   "Defronte ao grande Abismo Lacrimoso de obscuridades, estava desamparadamente sedento. Ele, sobretudo, no grande abismo flutuava com contrariedade à gravidade, realidade e razão. “Per Aspera Ad Astra”, — sussurravam os Seres Sussurrantes iluminados, híbridos e presos na obscuridade do Lacrimoso. Entretanto, suas luzes escuras eram de tanto offuscatio que as sombras imperavam Nele. No profundo isolamento, sentia vibrações. Pareciam-me altas notas. Cujas provinham Dele, feixes de luzes iluminavam todo o meio do diferente ser de túnica, que através desta, parecia-me esconder alguma desintegração, enigmático e taciturno. Observou-me, não aos olhos. Sempre imaginei que já sabia de minha presença. Algo portentoso havia dentre seus pulmões pulsantes de ar. Não podia vê-los, mas senti-los. De alguma forma, Ele fazia-me saber disto.
     As vibrações oscilavam. Eis que as Musas avisam-me, não a física palpável, a identidade das vibrações: “Ode an die Freude” — murmurava-me à mente. Bizarramente, apenas após disto dei-me a ver suas faces de expressivas alegrias. Já despido, Elysium diferentes de outrens, oscilava na Quasi una Fantasia.

      Observou-me, desta vez, com seus ofuscantes olhos sombrosos que me cativaram e aprisionaram-me. Então, senti liberdade infinita: os olhos d’aquele ser penetraram os meus.

     “Oh, amado Ludwig! As estrelas virão para ti, com o meu amor sem fim.” — Cantarolava para mim, que já estava beirando a inconsciência, em tom melódico. Havia em mim apenas a neutralidade.
      “E das sombras de teu coração emanarão nossa eterna comunhão” — retrucava-O.

     A Ode dos Seres Sussurrantes tornava-se mais alta ao ponto de que uma vasta sombra saia dentre os pulmões de Elysium. Os firmamentos em tom vermelho abalaram-se. Buracos Negros e Buracos Brancos colidiram-se criando tudo que há de perfeito, pérolas, rosas e morangos no céu. A Ode dos Seres Sussurrantes tornou-se apogética a uma crispação até às escuridões do abismo enquanto inconscientemente dançava de forma irreal com Claudius e a Donzela, adormeci.

      Agora havia gravidade, realidade, razão o bastante e o abismo de luzes sombrosas tornou-se o mais perfeito Abismo Lacrimoso de sombras iluminadas e obscuridades esclarecidas. Por fim, despido e “integrado”, Elysium trouxe-me às profundezas do perfeito abismo, onde agora Deus e Satã com mãos entrelaçadas, vieram, assim como os anjos e demônios, a cerimônia bailar.  Flutuando, com um único gesto, guiou-me da beira do abismo aos pés dEle. Tudo Nele era tão ofuscante que em poucos instantes encheu-me de sombras. Pasmaram-se todos ao verem a minha luz sobressaída a todos os deuses e demônios e Seres Sussurrantes. Deus sentiu-se humilhado e condenou todos os amistosos demônios e anjos ao fogo eterno.

     Pairo no vácuo impulsivamente sobre todos enquanto uma guerra jorrava fogo atrás de mim. Eis que torno-me o Deus sol e todo o sangue, desesperanças, desventuras, desilusões, fomes e pestes cessam-se quando do sedento ao apaziguador torno-me. Mas este não era meu objetivo após o desfecho das objeções. Da mesma forma que pairei à cima, desci ao meu amado enquanto os Seres Sussurrantes reprimidamente sussurravam ao som de tambores, flautas e harpas: “Per Aspera Ad Astra.”

      Olhei nas profundezas de seus olhos negros, e falou-me à mente: “Oh, amado Ludwig! As estrelas vieram a ti, com o meu amor sem fim.”

“E das sombras de teu coração emanaram nossa eterna comunhão!..., meu Elysium.” — Retruquei-lhe beijando-o. Após, abraçamo-nos, damo-nos as mãos e como as estrelas das sombras perfeitas mostramos ao cosmos e a todos os deuses, demônios e Seres nossa perfeição e do nosso amor enquanto saíamos do abismo ao bailar das cintilantes estrelas.
     Eternamente amei-o e ele amou-me. Compus estridentes e catárticas composições amorosamente sutis e do nosso leite que alimentava nossa pequenina Hypatia nasceu as voluptuosidades da elegante Via - Láctea, que desta, por sua vez, proveio as sombras iluminadas: a vida e os humanos.

Ofegantemente inspirou e expirou.
— Eis aí, humanos! — falou o mendigo em tom arrogante para o guarda que o acordou pedindo para sair defronte da Grande Biblioteca Nacional de Quimerolândia.
— Saia já daí moribundo! — Gritou em tom extremamente arrogante.
— Arruínem-se, arruínem-se todos vós, destruidores de sonhos! — Respondeu ao guarda assentindo a ordem de retirar-se do local: berço da Quimerolândia."
     
     Também começarei a por títulos nos postes e organizar marcadores, mas ainda manterei a inexistência pública da opção de seguir este blogue.


     Cesinha, leio seu blogue desde o segundo dia deste ano. Já comentei como Herr Limes meses depois de teres escritos muitos dos teus postes só por introspecção e timidez mesmo. Posso não comentar, mas acompanho o desenrolar do drama de sua vida. Sucesso, caro rapaz!
     Margot, acompanho seu blogue desde julho e ainda não o segui por motivos inconscientes. Gosto de ver o mundo e a sensibilidade dalgumas pessoas nele, eu vejo isso no que escreves e vejo nos comentários de seus postes também. E seu blogue também é remédio quase tão bom quanto escrever. Iluminação e paz, cara Margot!
     Eu não imaginava ter ninguém aqui comentando, e por isso o nome era Reflectere, pois servia apenas para mim. Mas agora estou começando a aceitar que se escrevo, escrevo para o mundo. É a dor de quem tem filhos. Agradeço a quem esteve acompanhando as lágrimas de nascimento dum bebê.


Grande abraço,
até a próxima!

domingo, 24 de junho de 2012

O Objetivo da Sociologia no Ensino Médio

Este é o primeiro poste nomeado cá. Esta é uma redação de sociologia na qual minha nota foi 5,5. Penso que ao menos eu mereceria seis ou sete pontos. Mas eu já falei que não compreendo meu professor de filosofia/sociologia? Vamos à  pequena redação:

A sociologia estuda os indivíduos aglomerados mediante um senso comum que os une, e  as suas relações e ações no meio social, tais ações citadas, fazem expressar individuais desejos ou não no meio coletivo.

O Ensino Médio constituído por adolescentes, pois cá não trato do EJA, é um relevante espaço de construção de seres pensantes que atuarão na sociedade.

Estes adolescentes, na intensidade das idades, estão não só formando e construindo o corpo para o estágio de amadurecimento sexual — que é o objetivo final da vida: reproduzir-se e e tornar extensa a prole —, mas fazendo alicerçar a formação intelectual que há de realmente fazê-los indivíduos na sociedade em junção de tal amadurecimento.

Num país onde a conquista da democracia deu-se recentemente, e onde as pessoas costumam ser "pensadas", a Sociologia deve ter o objetivo de formar seres críticos prontos para relações complexas em grupo, viando a construção de uma sociedade mais justa e universalmente consciente do papel de nossa espécie.

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Eu sou um idealizador... e um idealizador carecente também.

Idealizadores e idealizadores carecentes costumam sempre ter atitudes como a que eu tive tempos atrás no autocarro com um rapaz. Pessoas com essas características também tornam-se frequentemente sorumbáticas. O texto em sequência é uma compilação dum correio eletrônico enviado a uma confidente amiga. O que está escrito demonstra como são esses tais idealizadores mencionados já.

..., 19 de Abril de 2012.

Querida C.,

Decidi. Apenas estive decidindo. O que decidi? Escrever-te sobre
coisas quaisquer. Eu pretendo te contar alguns ocorreres nos fluídos
de meu tempo. A água que flui em meu rio do tempo é quase negra, como
os rios dos manguezais do Recife. Por vezes, encontro-me com a água
azulada do mar, então venho a tornar ser esta mistura com o céu escuro
estrelado e com a atmosfera noturna iluminada pela luz lunar tímida.
Escrevo-lhe tudo isto enquanto aprecio os pianos trios em forma-sonata
do compositor tcheco Jan Ladislav Dussek.

[...]

Ao voltar da Escola de Artes, estava no autocarro. Este esteve sendo
um dia interessante. O senhor do sebo sorriu-me enquanto punha em
minha mão um livro de literatura luso-brasileira. Ainda disse, tirando
o livro quase preto de pó de baixo dum
monte Olimpo de livros : "Tem Miguel de Cervantes. Muito bom. Ninguém
vê, ai ninguém leva." "Ele poderia presentear-me com este livro." —
Penso enquanto reciproco-o com igual sorriso na cara. Além disso,
parece-me que mim diz a memória que foi neste mesmo dia uma senhora
chamada F. cujo último nome lembro, cumprimentou-me ao ver minha
humilde pessoal sentado abaixo de uma árvore a ler um livro. Quando
largamos, pude ver os outros educandos nos vendo a conversar e a rir e
pensando: " O que ela tem de melhor? Ele tá sempre sozinho, e agora
depois de semanas está rindo com alguém tão enrugada quanto..."

Por fim. Voltando à noite no autocarro, do qual, posso fazer um
trajeto "X". O meu trajeto de noite é o
retorno. Neste noite, não tive inspirações para novos escritos, não
decidi começar e não terminar uma nova composição para dois violinos e
decidi não fazer teste de concentração no congestionamento ruidoso ao
tentar ler um dos vários livros que fazem ocupar espaço em minha
colossal e enorme mochila. Não era um dia comum, pois chovia muito.

Eu não entendi porque as pessoas preferem fechar as janelas para
sentirem-se numa chaleira fervendo chá cigano a sentir a brisa fria e
úmida da gotas de água da chuva, que são despedaçadas para longe de
seus amores no quebrar do vento, que bate no autocarro com velocidade.

Gosto de observar a tragédia humana, portanto, costumo sentar ao lado
da janela. Neste dia, não houve sequer um universitário  para sentar
ao meu lado com livros de engenharia robótica em língua inglesa, ou
adolescente que inventam jogos aparentemente inocentes mas macabros
para ocupar o tempo quase perdido no congestionamento.

Um ser feminino senta ao meu lado. A descrevo deste modo por não
lembrar suas características e feições, e principalmente, porque as
pessoa parecem morrer nos autocarros. Mas quando passamos daquela
camada de tez, poderemos ver grandes Sinfonias, grandes mundos. Estão
todos cansados dos próprios vermes em seus putrefatos corpos, mas
estes vermes causam o péssimo odor que faz atrair os seus alimentos
diários, os corvos, que por vez destes, os tornam fortes como a neve.

Desculpe-me interrompê-la, aprecies isto e voltes até mim:
http://www.youtube.com/watch?

v=m9yTzwe710U

O ser feminino chega ao seu ponto de parada, no qual, muitas pessoas
também costumam esperar o seu transporte. Bom rapaz que sou, retiro-me
de minha cadeira para a senhora não ter problemas com minha enorme e
colossal mochila com grossos livros. Neste ínterim, um cavalheiro, no
limiar da fase adulta penso eu, aproxima-se para tomar posse da
cadeira, que nestes dias de congestionamento são muito desejados pelas
pernas. Ele parecia estar fazendo pisar naquele autocarro em tão
pouquíssimo tempo.

A senhora vai-se sem agradecer. Mas não importo-me ao ver aquela face
em minha frente que, apesar de não ser de beleza apolínica,
encantou-me. Não posso compreender os mistérios todos na vida. Talvez
porque ainda não sou humano o suficiente, sou mais animal com
instintos emocionais do que humano cósmico transcendental. Estas
atrações instantâneas que nos ocorrem parecem-me estar além de nosso
entendimento e de nossa consciência biológica-psicológica. Somos
presos à eles como múmias faraônicas em seu bálsamo eterno.

Entre tantos ruídos nada melódicos e buzinas no congestionamento, pude
ouvir a sua voz falar-me, mas não compreender-me. De modo que faz-me
pensar que ele disse "que foi boy?" Meus ouvidos estavam concentrados
em sua face, então, faço pensar que ele provavelmente disse "Eu
posso?", pois logo após a imemoriável e incerta frase gramaticalmente
correta, ao menos disto tenho certeza  (mas como posso ter certeza que
a frase pronunciada por sua boca e arquitetada por sua Área de Broca
pode estar gramaticalmente correta se não posso ter certeza do que
falou-me ele?), expressei um sorriso em que aperta-se as partes
superiores e inferiores do lábio, pondo as extremidades esquerda e
direita um pouco confusas quanto a direção dele na cara, um ponto que
diferencia as expressões de tristeza e a sorridentemente alegria,
também ocultando os dentes incisivos que são os sóis dos sorrisos para
muitas das pessoas. Um altruísta sente-se feliz ao ver o Sol nos olhos
negros de alguém sorrindo.

Talvez, estava eu, ocultado meu sorriso feliz por encontrar uma cara
viva entre as faces mortas. Sua cara era vermelha (então ele gosta
mesmo do clima no Recife?), nada tão visceral é quanto ver o sangue na
cara de quem tu amas. Céus! Oh, céus! Eu amo um desconhecido. Como sou
perverso!

Voltando ao sorriso ocultador de incisivos e sentimentos, enquanto
fazia-o, dei-lhe o cadeira ao lado da janela com um gesto licenciador
da mão esquerda apontando para a cadeira um pouco abaixo de meu
abdômen. Expressa seus sentimentos com uma palavra; após, senta-se na
cadeira com o meu mesmo sorriso, porém um pouco mais hesitante.

Nem uma das bocas das faces mortas, em nem um dia sequer, comentou à
mim, um desconhecido, sobre a chuva e as soluções do para o
congestionamento com tanta humanidade. Comentou à mim, uma das coisas,
que naquele momento, eu comentaria para alguém, mas por repressão
mesmo, não comento, falou das criança sonolentas com suas mães  nestes
transportes. Ele também não compreende o motivo de as pessoas terem
preferência em fechar as janelas para sentirem-se numa chaleira
fervendo chá cigano a sentir a brisa fria e úmida das gotículas de
água, que despedaçam-se para longe de seus amores no quebrar do vento,
que faz bater velozmente no autocarro.

Ele decidi abrir a janela e sentir a brisa fria e úmida das gotículas
de água despedaçantes à longínquos pontos de seus amores no quebrar
dos ares, fazedor de velozes batidas em o autocarro, e pergunta-me se
aquilo faz-me ter desagrado; então respondo após segundos de tensão
que aquilo está perfeito.

O congestionamento o deixou sem vontade de ócio, o que fá-lo desejar
acessar seu correio eletrônico. Mas a conexão estava péssima naquele
dia chuvoso, o que o faz distrair-se para os lados e perceber que eu
olhava atentamente para a tela do celular. Ele faz rir e comentar que
uma colega sua passaria em Recife, mas não o visitaria. "Pode isso?"
Disse-me. Ele tenta acessar o YouTube, mas a página estava em inglês e
pergunta se eu posso ler e traduzir. Faço-o, mas ele faz desistir.
Céus! Magno foi o instante em que descobri que seu nome é A. ao
reler seu endereço de E-mail enquanto tentava logar novamente.

Eu não sei o que poderia ocorrer se eu o falasse olhando em seus
olhos. Eu sempre tentava fitar em nada, e respondia aos seus sorrisos
mais leves e delicados que as madrugadas, onde as estrelas tornam-se
penas para fazer-nos rir de nossa triste comédia.

Vai-se o tempo. Ele fecha a janela; mas depois disse-me que se sente
numa saúna (achei bom ele não ter-me perguntado se não me sentia
também), então abre-a; a chuva para enquanto aproxima-se o meu
destino. Neste tempo, descubro que ele é casado e possui uma filha,
então sinto-me imoral. Sinto-me tanto que desta vez fito os seus
olhos.

Volta a chover e ele faz anuncio que seu destino aproxima-se, pois
pretende pegar um outro transporte opcional para o aeroporto. Oh,
Céus! Os meus tambores sentimentais começam a tocar num ritmo mais
marcante, pois dou-me a saber que ele descerá exatamente em meu
destino. Além disso, ele não parece ser recifense. Pois aqui, os atos
urbanos não matam a natureza.

Fiz pensar que aquele estava sendo um instante raro em que uma
preciosa pessoa, por acaso, faz-me ter sentimentos tão agradáveis.
Tornou-se impossível não deixar-se ir com as últimas gotas de água que
caíam das árvores nos jardins dos edifícios para a terra agora
molhada. Eu deveria mostrar-se, ao menos, um pouco mais simpático.

Ele retira seu guarda-chuva após anunciar que está chegando ao seu
destino; segundos após retiro o meu. Ele era um enorme guarda-chuva, o
que faz A. o fazer uma observação incomum, mas que eu também
faria: "São desproporcionais." Eu não posso resistir a rir muito com
ele e assentir com pouca dificuldade à sua observação.

Então, de súbito, pede licença e levanta-se, eu sabia que também
estava chegando ao meu ponto, mas decidi deixá-lo levantar-se; pedir a
parada e ir à porta traseira do autocarro. Ele estava a alguns passos
atrás de mim, então  ri silenciosamente todos aqueles risos,  que não fiz em
sua presença. Eu sabia que estava arrependido e não pretendia mesmo
estar ao seu lado na partida.

Quando chegamos ao nosso destino, esperei ele descer do autocarro para
levantar-se cadeira e descer também. A chuva tornou-se torrencial
naquele momento e em segundos, ao descer do autocarro, pude vê-lo com
dificuldades para abrir o guarda-chuva (eu o abri agilmente em três
segundos).

Olho para trás e digo a mim mesmo ao vê-lo olhando-me também partir:
"Que belo ser! Sua desconfiança em eu tê-lo enganado na tradução
certamente revela que, talvez, ele teve uma decepção. Foi com sua
esposa? Ela o destruiu?..." Interrompo os pensamentos pois sentia-me
novamente imoral. Farei meu rumo. Fi-lo, mas absolutamente absorto no
que ocorreu.

Nos diálogos do fim de dia com minha mãe, ele pergunta-me as novidades
e invento toda uma história de uma tal garota que conheci de volta
para casa. Minutos depois da expressão de felicidade de minha mãe por
ver que o filho está sendo "normal", sinto-me muito melancólico.

Durante as duas semanas que passam, desmotivo-me de tudo, pois ele sequer
soube meu nome. Ou a minha mãe não sabe o meu nome?Sim.

Com sentimentos,
Unillimes
P.S.: Não revisei nada, lamento pelos erros ortográficos.

quarta-feira, 6 de junho de 2012

Dies Irae


     Amanheci em cólera. Não, não, o mundo não me agrada. A maioria das pessoas estão mortas e não sabem, ou estão com vivas com charlatanismo. E o amor, em vez de dar, exige,.E quem gosta de nós quer que sejamos algumas coisa de que eles precisam.Mentir dá remorso. E não mentir é um dom que o mundo não merece. E nem ao menos posso fazer o que um menina semiparalítica fez em vingança: quebrar um jarro. Não sou semiparalítica. Embora alguma coisa em mim diga que somos todos semiparalíticos. E morre-se, sem ao menos uma explicação. E o pior —  vive-se, sem sem ao menos uma explicação. E ter empregadas, chamemo-las de uma vez de criadas, é uma ofensa à humanidade. E ter a obrigação de ser o que se chama de apresentável me irrita. Por que não posso andar em trapos, como homens que às vezes vejo na rua com barba até o peito e uma bíblia na mão, esses deuses que fizeram da loucura um meio de entender? E por que, só porque eu escrevi, pensam que eu tenho que continuar a escrever? Avisei a meus filhos que amanheci em cólera, e que eles não ligassem. Mas eu quero ligar. Quereria fazer uma coisa definitiva que rebentasse com o tendão tenso que sustenta meu coração.
     E os que desistem? Conheço uma mulher que desistiu. E vive razoavelmente bem: o sistema que arranjou para viver é ocupar-se. Nenhuma ocupação lhe agrada.  Nada do que eu fiz me agrada.E o que eu fiz com amor estraçalhou-se. Nem amar eu sabia, nem amar eu sabia. E criaram o Dia dos Analfabetos. Só li a manchete, recusei-me a ler o texto do  mundo, as manchetes já me deixam em cólera. E comemora-se muito. E guerreia-se o tempo todo. Todo um mundo de semiparalíticos. E espera-se inutilmente o milagre. E quem não espera o milagre está ainda pior, ainda mais jarros precisaria quebrar. E as igrejas estão cheios dos que temem a cólera de Deus. E dos que pedem a graça, que seria o contrário da cólera.
    Não, não tenho pena dos que morrem de fome. A ira é o que me toma. E acho certo roubar para comer. — Acabo de ser interrompida pelo telefonema de uma moça chama da Teresa que ficou muito contente de eu me lembrar dela. Lembro-me: era uma desconhecida, que um dia apareceu no hospital, durante os quase três meses que passei para me salvar do incêndio. Ela se sentara, ficara um pouco calada, falara um pouco. Depois fora embora. E agora telefonou para ser franca: que eu não escreva no jornal nada de crônicas ou coisa parecida. que ela e muitos querem que eu seja eu própria, mesmo que remunerada para isso. Que muitos têm acesso a meus livros e que me querem como sou no jornal mesmo. Eu disse que sim, em porque eu também gostaria que fosse sim, em parte para mostrar a Teresa, que não me parece semiparalítica, que ainda se pode dizer sim.
     Sim, meu Deus. Que se possa dizer sim. No entanto neste mesmo momento alguma coisa estranha aconteceu. Estou escrevendo de manhã e o tempo de repente escureceu de tal forma que foi preciso acender as luzes. E o outro telefonema veio: de uma amiga perguntando-me espantada se aqui também tinha escurecido. Sim, aqui é noite escura às dez horas  da manhã. É a ira de Deus. E se essa escuridão se transformar em chuva, que volte o dilúvio,  mas sem a arca, nós que não soubemos um mundo onde viver e não sabemos de nossa paralisia como viver. Porque se não voltar o dilúvio, voltarão Sodoma e Gomorra, que era a solução. Por que deixar entrar na arca um par de cada espécie? Pelo menos o par humano não tem dado senão filhos, mas não a outra vida, aquela  que, existindo, me fez amanhecer em cólera.
    Teresa, quando você me visitou no hospital, viu-me toda enfaixada e imobilizada. Hoje você me veria paralítica e muda. E se tento falar, sai um rugido de tristeza. Então não é cólera apenas? Não, é tristeza também.

Escrito por Clarice Lispector e publicado no Jornal do Brasil a 14 de outubro de em 1967.

É assim que me senti ontem, é assim que sinto-me hoje.

sábado, 2 de junho de 2012

Feliz! Meus contos e novelas possuem mais de 1.400 visualizações no autores.com.br .